XXXIV - Ad Mala Facta Malus Socius Socium Trahit

O modo de saída seria óbvio. Menditus, Plínio e Geraldus iriam cortar umas árvores, depois Gaius, através de avançados cálculos matemáticos, iria construir as bases para uma embarcação durável, capaz de os levar até ao próximo porto civilizado, onde pudessem partir para Roma para, finalmente, acabarem com o reinado de César.
Menditus e Geraldus opinavam sobre que árvores haviam de cortar, enquanto Plínio ia cortando desalmadamente.
- Já davam uma ajudinha não? – Plínio nem sequer olhava para eles, tão compenetrado que estava a cortar os coqueiros.
- Não… - Geraldus leva a mão ao queixo. – Sabes, isto não é qualquer árvore que se corta. É preciso critério.
- Nem mais. E o problema é que não estamos bem de acordo quanto ao critério, Plínio.
- Já sei, Plínio, estás a ver aquele coqueiro ali mais à frente. Vai lá cortá-lo. É grande e forte. Já que estás numa de cortar coqueiros à maluca, que seja aquele.
Plínio seguiu as indicações de Geraldus, enquanto este e Menditus continuavam a discutir a problemática da resistência da madeira à água salgada.
Passados alguns minutos, quando os dois já se encontravam sentados no chão em amena cavaqueira sobre todos os assuntos menos árvores, um barulho estranho fez com que se levantassem e fossem ver o que se passava com Plínio. Ao espreitarem por entre as árvores, viram Plínio ser abordado por uns sujeitos armados com espadas. Menditus pediu silêncio a Geraldus, para tentarem ouvir o que se passava.
Plínio estava a ser acusado de derrubar árvores ilegalmente e seria, por isso, preso numa prisão de alta segurança. Ficaram a saber que se encontravam na Sardenha, o que, por um lado, até era bom sinal. Estavam perto de Roma, depois de se livrarem desta embrulhada chegariam em poucos dias a casa.
- Vá, vamos lá buscar o Plínio e vamos embora.
- Não pode ser, Geraldus. Eles são mais que nós e nós não temos armas!
- Menditus, mas eu sou um homem! Tenho que salvar o meu discípulo.
- Geraldus, não é altura para mentiras. Vamos aguardar e segui-los. Assim, pode ser que possamos, enfim, “pedir emprestado” uma embarcação para seguirmos para Roma.
- Sim, de facto seria imprudente avançar… Mas vamos salvar o Plínio, ou não me chame eu Zuleida!
- … - Menditus abana a cabeça de modo condenatório. – Tu chamas-te Sancto Geraldus.
- Ah. Pois. Mas, vamos salvá-lo. É isso que importa!
Voltaram para trás, foram chamar Salvadorus, Edgar e Gaius e seguiram no encalce dos captores de Plínio. Quando chegaram ao local onde Plínio iria ser presente a um juiz e preso, Edgar colocou a capa preta e foi assistir ao julgamento. Assim, conseguiria saber o local onde Plínio seria preso, podendo assim libertá-lo e seguirem o seu caminho.
O julgamento corria serenamente e Plínio, não sabendo que Edgar estava a assistir ao julgamento, estava destroçado pelo facto de os seus amigos não o terem salvo. No momento da leitura da sentença, o terror apoderou-se da sala:
- Pelo crime de atentado à natureza, condeno o arguido Plínio Plagius à pena de morte, na penitenciária de Foxus Rivus.
- Foxus Rivus?! – Perguntaram os presentes. – Que Zeus tenha pena da tua alma.
- Então? – Zeus levanta-se na sala. – Porque é que têm que trazer o meu nome sempre à baila. Estou de folga hoje pá!
Edgar saiu sorrateiramente da sala e apressou-se em contar aos outros o que se tinha passado. A reacção foi naturalmente de choque e apreensão.
- O que fazemos agora?
- Algum de nós tem tirá-lo de lá… - Menditus olhava à sua volta.
- Eu vou! – Geraldus deu um passo em frente.
- Tu? – Pergunta Gaius.
- É simples. Eu arranjo maneira de se preso e ir para a mesma prisão do que ele. Depois ajudo-o a sair e fugimos para Roma. Que tal?
- A ideia é boa na teoria… Mas será difícil.
- Não há problema. – Geraldus estava decidido. – Confiem em mim.
Geraldus seguiu para o centro da cidade, com Edgar por perto a vigiá-lo, e procurou algo que pudesse fazer para que fosse preso. Viu a loja Studius Casis, e entrou. Pensou que se a assaltasse e ferisse alguém que iria certamente ser preso.
Aproximou-se do balcão, e quando encarou o funcionário o tempo parou: era uma rapariga, um pouco mais baixo que ele, e, apesar de não ser uma beleza exótica, havia algo nela que lhe agradava muito.
- Olá…
- Olá… - Respondeu a rapariga, com um sorriso enternecedor.
- Eu vinha assaltar a tua loja e…
- O quê?! – A rapariga ficou sobressaltada.
- Não! Não! Não era isso que queria dizer! – Geraldus juntava as mãos como se pedisse perdão. Eu queria uma er… - Viu um expositor com porta-chaves. – Este.
- Este? – A rapariga olha para o expositor. – Estão aqui dezenas deles.
- Ah, bom, então… Er… Queria, pode ser este aqui-
Ela tira o porta-chaves e olha para ele.
- “Sou a Rainha da Noite”? É este?
- Não! O do lado!
- “Homem Procura-se”?
- Não. Esqueça. Eu vim cá mesmo assaltar a loja. Eu sei que parece estranho, mas é que o meu amigo Plínio está na prisão e eu tenho que o safar de lá. Eu não sou homem para roubar.
- Isso já vi eu. A parte do homem, claro.
- Pode auxiliar-me? Nós “simulamos” um roubo, e uma morte de alguém. Pode ser?
- Não sei porquê mas algo me diz que devia confiar em ti. Sou a Michelle. Michelle K.
- Que nome exótico. Sancto Geraldus, Menino, Gladiador.
- Mujto prazer. Podes ficar só aqui na caixa um bocado para eu ir chamar uma amiga. Para simularmos o assassinato.
- Ah, sim, claro. Eu trabalho numa livraria, isso caixas é comigo. Geraldus ficou lá a aguardar pacientemente. Começou a olhar à volta a ver os produtos, até que foi interrompido por uma feminino e sensual “Bom dia”.
- Bom… Bom dia… - Geraldus não queria acreditar na beleza que tinha à sua frente.
- Podia-me trocar esta nota de seiscentos sestércios. Sei que parece grande, mas, se formos a ver, não é assim tão grande.
- É como eu. Quer dizer. Não. Raios. Sim. Eu troco-lhe.
À medida que Geraldus ia tirando as moedas da caixa a rapariga ia falando e tocando-lhe nas mãos enquanto tirava as moedas. Quando Geraldus se despediu dela, viu que tinha esvaziado completamente a caixa.
Michelle K .voltou e ficou espantada ao ver a caixa apenas com a nota de seiscentos sestércios.
- O que é que se passou?! O meu dinheiro?!
- Ah, veio cá uma rapariga simpática e eu troquei-lhe uma nota… Porquê?
- Desapareceu o meu dinheiro todo! Querias ir para a prisão, então boa sorte!
Michelle K. chamou os guardas e estes levaram Geraldus para o tribunal. Edgar estava novamente sentado nos lugares traseiros do tribunal, à espera da sentença.
- Geraldus, está condenado por roubo a passar uma semana em Caxius.
- Caxius? Mas eu quero ir para Foxus Rivus!
- Foxus Rivus? Mas isso é uma prisão de mulheres.
- De mulheres? É lá que está um amigo meu!
-Ah, a “Maria Alice”? Sim, está lá. Bem… Se te queres juntar a ela… “Anastásia”, podes ir ter com a tua amiga. Para Foxus Rivus, já!
O martelo bateu com estrondo na mesa, enquanto Geraldus era levado pelos guardas. Ao sair, fez sinal a Edgar para começar os preparativos para a saída para Roma.
Ao chegar à prisão, Geraldus tratou logo de procurar Plínio, mas não conseguiu encontrá-lo. Estava na hora de recolher à cela, teria de esperar pela manhã seguinte. Conheceu o seu companheiro de cela, Bellicus, que lhe pareceu um rapaz responsável que até se ofereceu para aquecê-lo durante a noite, o que Geraldus recusou por até estar bom tempo, apesar de agradecer a atenciosidade.
Na manha seguinte procurou Plínio no pátio. Viu-o ao longe, a levantar pesos. Quando chegou ao pé dele este não queria acreditar.
- Geraldus! O que fazes aqui?!
- Vim salvar-te. Como sempre.
- Porque é que não me salvaram logo? – Plínio estava incrédulo.
- Então… Porque assim nós conseguimos preparar a partida para Roma sem correr o risco de tu começares a filosofar e coisas assim do género. É meramente uma questão de sanidade mental.
- … Olha, temos de nos separar a guarda. Os guardas estão a desconfiar. Encontra-te comigo aqui depois do almoço.
Assim fizeram. Umas horas depois, lá estavam eles no mesmo local, prontos para delinear o plano de acção.
- Olha lá… O meu companheiro de cela., o T-Bagus, parece ser um rapaz simpático.
- O Bellicus, o meu companheiro, também. É uma prisão decente, esta.
- É, .não é? Vê lá que o T-Bagus falou com o Bellicus e estão a pensar em fazer “swingus” connosco.
- “Swingus”? – Inquire Geraldus. – O que é isso?
- Não sei, deve ser algum desporto. Eu acho que devíamos aceitar.
- Plínio… Vamos ali atrás do pavilhão. Tenho uma coisa para te mostrar…
Quando chegaram ao local, Geraldus começou a tirar a camisola.
- Geraldus! Se pensas que eu vou “sentir” algum dos teus músculos estás engando, e…
- Cala-te…. E vê.
Tirou a camisola totalmente e Plínio pôde vislumbrar a imponente tatuagem que ocupava todo o seu tronco.
- Geraldus… Isso é um mapa da prisão para que possamos fugir?
- Não. É uma borboleta. É gira, não é?
- Uma borboleta?! Porque não tatuaste o mapa da prisão com a rota da fuga?!
- Epá, eu até fui lá com esse intuito, mas esta borboleta… Ficava bem com o meu "cai-cai" novo... Não sei, parece que chamava o meu nome. É a “Maria”.
- … E agora o que é que vamos fazer?!
- Fugimos de qualquer forma. Estou farto de aqui estar!
- E a ideia do “swingus” não me parece nada bem!
- Vamos fugir daqui!
Plínio e Geraldus começaram a correr e a derrubar os guardas, abrindo caminho até ao portão principal da prisão. Quando saíram, já tinha Menditus numa carroça à porta, pronto para levá-los ao porto, onde os restantes elementos aguardavam num barco, entretanto dominado por Salvadorus, que incapacitou toda a tripulação em pouco mais de trinta segundos com a sua cover do “If You Tolerate This” dos Manicus Stritus Prichus.
- Para Roma! Rápido! – Gritou Plínio. – César! O teu final aproxima-se!

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